quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Residência deixa clara a intenção dos arquitetos de dissimular a estrutura em vez de marcá-la como elemento construtivo



O pavilhão parece flutuar no pequeno lago
Minimalismo evita uso da estrutura como elemento construtivo
Assim como a tradicional forma do soneto é freqüentemente revisitada pelos poetas, o pavilhão parece fonte inesgotável para os arquitetos. Na casa em São Luís do Paraitinga, a cerca de 170 quilômetros da capital paulista, os arquitetos Cláudio Libeskind e Sandra Llovet dão sua contribuição para esse partido, numa residência que deixa clara a intenção de dissimular a estrutura, em vez de marcá-la como elemento construtivo.
A casa-pavilhão - volume prismático coberto por laje, com aberturas nas faces maiores e empenas nos lados menores - faz parte do imaginário arquitetônico moderno. É uma tipologia empregada por diversos profissionais, nos mais variados países. Esse modelo surge como um extrato do edifício laminar, criado por Le Corbusier em 1930. Se nos primórdios do modernismo não é comum encontrar residências desse gênero - mais freqüentes na segunda geração de profissionais, como na obra do grego Aristotelis Konstantinides -, nos últimos anos elas se tornaram figurinhas carimbadas nas publicações especializadas, seja no Japão, seja na Austrália, ou então no Chile, Portugal ou Holanda. No Brasil, para se ter uma idéia de sua popularidade entre os arquitetos, basta lembrar que nas duas últimas edições de PROJETO DESIGN, sem nenhum propósito editorial, as casas apresentadas tinham o partido do pavilhão (na edição 343, o projeto do escritório Una Arquitetos, em Joanópolis, SP; no número seguinte, a proposta do Studio Paralelo, em Bento Gonçalves, RS).

Nesse contexto se situa também a residência em São Luís do Paraitinga, desenhada por Cláudio Libeskind e Sandra Llovet, que coincidentemente, tal como as duas recém-publicadas, está localizada no meio rural. Mas se a casa-pavilhão é uma proposta tão usual, por que perder tempo observando mais um projeto do gênero? A graça está em esmiuçar as contribuições particulares que cada profissional dá ao tema - tal como se fosse um soneto, que tem sempre 14 versos e quatro estrofes (dois quartetos e dois tercetos), mas é invariavelmente revisitado pelos poetas. Ou seja, a casa-pavilhão é irresistível.

Situada no meio de uma grande gleba coberta por mata atlântica, a residência - implantada no sentido norte-sul - ocupa uma clareira próxima ao rio Paraibuna. A dupla de arquitetos foi a oitava equipe a ser chamada para desenhar a casa de fim de semana para um jovem colecionador de arte contemporânea. O cliente convocou profissionais e encomendou estudos; insatisfeito com os resultados, pagava o combinado e procurava outro projetista. Para todos, ele indicava que a morada deveria ser erguida em uma das encostas, pois imaginava que dali a edificação teria a melhor vista. “Quando visitamos o lugar, logo percebemos que havia um recanto muito agradável junto a um dos lagos artificiais”, relata Libeskind.

Vista por trás, a casa também parece suspensa

Foto do final da obra, ainda sem paisagismo; em destaque, a pérgula da garagem

A construção está apoiada sobre muro de concreto, deixando o varanda em balanço sobre o lago

O pilar metálico maciço, com seção de dez centímetros de diâmetro, sustenta parte da estrutura
“E fizemos o que sempre fazemos: no primeiro estudo, apresentamos um partido com a nossa opinião, mesmo que ela se contraponha ao solicitado. Se não dá certo, realizamos o que foi pedido no segundo estudo”, confessa. E assim foi: os autores propuseram a casa com um pavimento - o cliente queria dois - e implantada junto ao lago. E a proposta foi aceita. Um dos pontos de destaque do pequeno pavilhão, com 450 metros quadrados, é o sistema construtivo. Calculada pelo engenheiro Ibsen Puleo Uvo, a estrutura é mista: as duas empenas laterais são de concreto armado, enquanto o restante da edificação apóia-se em pequenos pilares metálicos. Na área de estar, onde os vãos são maiores, ficam aparentes as quatro delgadas colunas metálicas maciças, com seção de dez centímetros. Nos dormitórios, por sua vez, há pilares metálicos, cada qual formado por peças em T e em U, dentro das paredes de drywall.

Abaixo da varanda de concreto, há ainda um deque de madeira

A área da churrasqueira não possui fechamento
Eles estão desalinhados em relação aos da sala, o que demonstra não a rigidez do projeto, mas a busca por um resultado final mais limpo, quase minimalista. Isso dá uma pista da idéia corrente em todo o desenho: os projetistas desejam que a estrutura desapareça, não têm a intenção de marcá-la como elemento construtivo. Seguindo na mesma linha, igualmente interessante no projeto são as instalações, dispostas em um pavimento técnico - com cerca de 1,5 metro de altura -, situado embaixo do piso da casa.

Entre outros requintes do pavilhão estão ainda os trilhos de iluminação, que foram embutidos na laje maciça, e o fechamento em guilhotina que, eventualmente, pode separar o balcão entre a cozinha e a sala de estar. Neste caso, outro truque: o contrapeso está dentro do drywall. Para abrigar os carros, os projetistas desenharam uma pérgula de madeira perpendicular ao volume da casa, sustentada por duas vigas metálicas.

As vigas, por sua vez, estão apoiadas, de um lado, em tirantes conectados à laje da residência (que só possui vigas de borda) e, do outro, diretamente no terreno, pois encontram o talude em nível. Essa interpretação topográfica, mesmo que sutil, faz o reconhecimento do lote e sua nova ocupação, assim como também o faz o muro de concreto em que a casa está apoiada.

Deque de madeira

Amplos caixilhos permitem integração entre interior e exterior
“As construções que existiam ali eram muito úmidas. Por isso também levantamos um pouco o piso”, lembra Sandra, referindo-se às duas edificações anteriormente existentes e que foram demolidas, a sede da propriedade e a casa do caseiro. Libeskind e Sandra também desenharam a nova casa do caseiro e agora estão projetando uma pequena construção destinada à sauna, que ficará implantada junto a outro lago, a cem metros da residência, no sentido norte.

Ainda quanto à pérgula de madeira e metal, trata-se de uma referência sutilmente sentimental à casa em que Libeskind cresceu, desenhada na década de 1960 por seu pai, em São Paulo. Na construção no bairro do Pacaembu, o carro de David Libeskind ainda é protegido com solução semelhante.

Texto resumido a partir de reportagem
de Fernando Serapião
Publicada originalmente em PROJETODESIGN
Edição 345 Novembro de 2008


Croqui
Croqui

Na circulação dos quartos, o vidro é fixo, sem caixilho

Detalhe do encontro entre a viga metálica que sustenta a pérgula e o talude

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Fonte: Arco Web

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