A casa de vila onde a arquiteta Kita Flórido, 47 anos, morava com o marido, Val Oliveira, 44, no Planalto Paulista, em São Paulo, ganhou ares de depósito de revestimentos desde que os dois começaram a arrematar vigas de peroba-rosa, tijolos de demolição e cruzetas para um projeto que não saía de suas cabeças – uma casa sustentável com jardim. Na época, os dois vislumbravam uma mudança radical, que aconteceu com a gravidez do primeiro filho, Tobias, hoje com 11 anos. “Procuramos muito até encontrar o terreno ideal, na Granja Viana (em Cotia, SP), com vista para a paisagem, insolação, uma rua linda e o melhor: clube, natação, inglês, tudo por perto”, afirma a arquiteta.
A distância de 12 km da capital não foi um empecilho. Kita, que trabalha com direção de arte de cinema, optou por passar mais horas em casa e Val, que tem uma produtora de cenografia, leva apenas dez minutos até lá. “Nós gostamos de ficar em casa e optamos por este estilo ecológico de quase não usar carro”, diz Kita.
A casa foi construída com o acervo de materiais conservado pela dupla na casa de vila. “A quantidade de janelas e portas de pinho-de-riga foi definida de acordo com o que já tínhamos comprado”, afirma Val. Como os tijolos de demolição não eram suficientes para a fachada, o casal encontrou uma olaria que queimou peças com a mesma medida.
As primaveras cobrem parte do telhado da varanda. À noite, a família se reúne nesse ambiente para assar salsicha e batata e curtir a tranquilidade do jardim, que ainda tem maciço de moreias e coqueiros
O piso de cruzetas esquenta a varanda, que também ganhou um painel, ao fundo, para dispor vasos de plantas. As pedras usadas nas colunas de sustentação do telhado foram trazidas de Campos do Jordão. Em uma das colunas, ancinho da Blue Gardenia. Como Val é de Londrina, PR, os churrascos são frequentes nos fins de semana. O forno de pizzas faz a diversão das crianças – elas as preparam
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O jardim tem várias árvores escolhidas pelos moradores, entre elas, os coqueiros jerivás. A área é a preferida de Kita para pintar suas telas. A piscina foi construída depois que as crianças aprenderam a nadar. A espreguiçadeira veio de Tiradentes, MG. Sobre ela, manta da Caixeiro Viajante e, ao lado, cestas do Depósito Kariri
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A fachada da casa, com telhado de duas águas, foi feita nos moldes da estação de trem Arpuí, em Piracaia. “Quando criança, eu costumava passar por aquela construção inglesa desativada e abandonada. O que fiz foi trazer aquele galpão para cá”, diz Kita. O jardim tem coqueiros jerivás, primaveras, moreias e bambus, espécies plantadas pelos moradores. “Cada um tem a sua árvore: a minha é um flamboyant, a do Val, uma araucária, a do Tobias, uma sibipiruna, e a da Teodora (a filha mais nova, de 7 anos) é um pau--ferro”, acrescenta ela.
A casa de 260 m² tem uma configuração que privilegia os prazeres dos moradores. Val adora cozinhar, portanto, a cozinha é o centro da casa, no térreo. No andar de cima, a área central é ocupada pela biblioteca, uma das paixões de Kita. Parte dos livros que ocupam as estantes de peroba-rosa veio da biblioteca do avô da arquiteta. Próximo a essa área, no mezanino, Kita planejou a “cabine do DJ”, como gosta de chamar. A pedido de Val, o canto tem um móvel com equipamentos de som para ele ouvir música.
Imagem de infância: a fachada lembra a estação de trem desativada Arpuí, em Piracaia, local que a arquiteta costumava visitar com frequência quando criança
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A casa foi projetada sem corredores. Centralizou-se a cozinha no térreo e a biblioteca no andar superior. Os dois ambientes são os mais curtidos da casa, já que Val adora cozinhar e Kita, ler. Atente para a escada, feita a partir de vigas de tesouras de telhados, de peroba-rosa, com o corrimão de ferro
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Na cozinha, a mesa de jantar antiga, comprada pela mãe de Kita em um antiquário, ganhou um tampo menor, de peroba-rosa, para continuar a história de cafés da manhã e almoços em família. A cadeira dos anos 1940 recebeu revestimento novo de veludo. A bancada antiga foi presente do serralheiro Paulo Bassetto. Piso de granilite e parede de cimento queimado. BOA IDEIA A lateral do berço patente de Tobias virou um esperto paneleiro
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A estrutura de molas de colchão – encontrada em uma caçamba na rua – foi limpa, envernizada e virou um painel no lavabo. No lugar do porta-toalha convencional, um galho torto. A pia de coluna antiga tem metais banhados em cobre. Na parede, fotos de família
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No térreo, além do living com lareira, há uma sala extra conhecida como sala “de bagunça”. É lá que Kita reúne os filhos para brincar e fazer atividades de arte. A arquiteta pinta telas e suas obras estão espalhadas pela casa. Desde que desacelerou no trabalho, ela é assessora voluntária de arte na escola dos filhos. “Quis passar mais tempo com os meus filhos, como observei minha mãe fazer.”
Na mesma sala, a arquiteta conserva a máquina de costura em que aprendeu a fazer os moldes usados pelas suas bonecas. Nos anos 1980, a costura rendeu frutos: Kita foi uma das fundadoras da marca de roupas Kaos Brasilis e a máquina a acompanhou nessa empreitada.
A sala tem lareira de cimento queimado e chaminé de cobre. Em cima dela, escultura Guerreiro do Vento, comprada em Caraíva, na Bahia. Ao lado do sofá, desenhado pela arquiteta, mesa dos anos 1950, comprada na feirinha do Masp
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As esquadrias foram feitas com vigas de peroba-rosa compradas antes de planejar a casa. Entre as peças de família encaixadas à decô, a cadeira dos anos 1930 (à esq.) veio do consultório médico do avô de Kita e o móvel baixo de canto, atrás da lareira, era uma cômoda da casa de bonecas de sua avó – peça original do Liceu de Artes e Ofícios. A mesa de centro, desenhada pela arquiteta, apoia o trombone, herança de sua mãe, e o prato de cerâmica comprado em Cunha. Sobre o sofá, a manta de crochê tunisiano foi confeccionada pela moradora. Os moldes de sapato viraram escultura na parede. Entre eles, há um modelo trazido de Paris e outro comprado no Lar Escola São Francisco
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A sala “de bagunça” abriga o móvel de armazenar cereais das antigas mercearias, que ganhou rodízios. Em cima dele, a cômoda da boneca Susi, de Kita, hoje guarda coisas de costura. A máquina de costura também é a mesma em que a arquiteta aprendeu a fazer as roupinhas de suas bonecas. Ao fundo, tela pintada pela moradora e, ao lado da porta de pinho-de-riga, a prova de que Teodora (junto ao irmão, Tobias) segue os passos da mãe: a caixa que pintou na aula de artes
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A escultura de compensado com pintura PU, criada por Kita e usada em um cenário, ganhou lugar na sala. Na parede, aquarela de Nilton Rezende, que a arquiteta trouxe do consultório do pai. O pendente – na verdade, um soquete com lâmpada – ilumina um dos cantos de leitura
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Outra brincadeira de criança que foi levada a sério é a reciclagem e restauração de móveis. “Adorava fazer casinhas para as minhas bonecas. Sempre gostei de adaptar as coisas de casa, como, por exemplo, transformar uma concha de feijão em poltrona ao colocar uma almofadinha e pendurá-la”, diz. Fácil notar essa paixão nas peças de família que a arquiteta conserva em casa. Kita trouxe a mesa da cozinha da casa de sua mãe. Do consultório médico do seu pai veio a balança que também serve de cabideiro no seu quarto. Ela possui até peças do consultório do seu avô, como a cadeira dos anos 1930, que fica na sala de lareira. A arquiteta também teve uma empresa de reciclagem e restauro, a Oficina Lavoisier, e algumas peças dessa época estão na decô, como o móvel que guarda os equipamentos de som de Val.
A varanda, área preferida de Kita para pintar suas telas, tem forno de pizza e churrasqueira usados frequentemente pela família. Não por acaso, ela gosta de pintar no jardim: “Eu não vejo casas, apenas o horizonte”. E continua: “A casa aumentou as minhas conexões com a arte, os filhos, o jardim e o trabalho voluntário. Aqui eu tenho tudo”.
No mezanino, a arquiteta criou uma “cabine do DJ” para o marido, Val, curtir suas músicas. O móvel tem equipamentos comprados na rua Santa Ifigênia, em São Paulo. A bicicleta de estimação de Val, presente do serralheiro Paulo Bassetto, foi presa ao guarda-corpo de ferro. Poltrona dos anos 1950 revestida de tecido pied-de-coq e tela pintada por Kita
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O quarto de Teodora revela outros atributos de Kita, a começar pela casinha de boneca, próxima à janela, com ambientes montados por ela. A cama em que Kita dormia quando criança, com cabeceira de palhinha, hoje é de Teô e está com a colcha de crochê feita pela moradora. Ao fundo, a vista da varanda. Tapete By Kamy
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Kita é apaixonada por livros. Herdou o gosto pela leitura do avô paterno, que tinha perto de 25 mil exemplares. “Eu passava as férias na biblioteca do meu avô”, diz. Parte desse acervo ocupa as prateleiras de peroba-rosa de sua estante. Em vez de parede, o fundo da estante foi coberto com gesso acartonado. Tapete da L’Oeil e ventilador antigo do avô da moradora
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O quarto do casal segue a linha sustentável do restante da casa. Kita confeccionou a cabeceira da cama: revestiu uma prancha de compensado com tecido branco, da Donatelli, que é fácil de tirar e lavar. Colcha da Blue Gardenia. A tela é criação da moradora. O quarto tem mezanino com acesso feito pela escada de peroba-rosa. O local é estratégico para fazer o turno das roupas de inverno e verão de acordo com a estação
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A balança que Kita resgatou do consultório médico do pai fica no quarto. Detalhe: a régua destinada a medir a altura serve de cabideiro. Ao fundo, a porta de pinho-de-riga também foi presente do serralheiro Paulo Bassetto
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No criado-mudo, mais histórias de família: Kita trouxe a jarra de prata da casa da mãe e a manteve escurecida, porque gosta do visual. Abajur de metal, da Secrets de Famille, e casal de bonecos antigo feito sobre rolha
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Justo o que eu procurava sobre corrimão de ferro e serralheria bh. Muito obrigada!
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